O frenesi em torno da inteligência artificial nos últimos anos foi inegável. Promessas de tecnologias disruptivas, soluções automatizadas e modelos de aprendizado revolucionários dominaram o mercado. No entanto, como ocorre em muitas ondas de inovação, após o pico do entusiasmo inicial, surge a pergunta crítica: quais projetos realmente fazem sentido no longo prazo?
Para líderes de tecnologia e empresários, entender essa questão não é apenas relevante, mas essencial para evitar armadilhas e priorizar investimentos estratégicos.
A maturidade da IA: onde estamos agora?
A IA passou por um período de intensa aceleração entre 2020 e 2023. Modelos como o ChatGPT, da OpenAI, e ferramentas de geração de imagens como o MidJourney capturaram a atenção do mercado. Mas o que vemos agora é um movimento de desaceleração, onde muitas empresas começam a questionar o retorno sobre o investimento (ROI) de projetos puramente experimentais.
Um relatório da McKinsey de 2023 indica que apenas 23% das organizações atribuíram pelo menos 5% de seu EBIT ao uso de inteligência artificial no ano anterior, sugerindo que a maioria ainda não conseguiu escalar soluções de IA de forma eficaz. Isso ocorre porque, embora a tecnologia tenha avançado, sua integração nos processos de negócios é frequentemente subestimada, levando a falhas por falta de estratégia ou recursos adequados.
Dado esse cenário, os projetos mais viáveis hoje têm três características principais:
Foco no impacto real no negócio: Como a IA pode resolver problemas concretos?
Escalabilidade tecnológica: As soluções são robustas e prontas para crescer?
Acessibilidade para uso e manutenção: Elas são economicamente viáveis e amigáveis para as equipes?
Setores promissores: onde a IA está fazendo a diferença
Certos setores se destacaram pela adoção bem-sucedida de soluções de IA. Veja alguns exemplos:
Saúde: IA para diagnósticos e eficiência operacional
A área da saúde tem sido uma das mais beneficiadas pela IA. Ferramentas baseadas em aprendizado de máquina estão sendo usadas para:
- Diagnóstico de doenças: Algoritmos treinados conseguem identificar condições como câncer em estágios iniciais com mais precisão do que médicos humanos. Por exemplo, um artigo de 2020 relatou que um software de IA desenvolvido por pesquisadores da Unicamp alcançou uma precisão de 86% no diagnóstico de câncer de pele, utilizando técnicas de aprendizado profundo.
- Assistentes médicos: Modelos de IA que ajudam na sumarização de consultas, na sugestão de diagnósticos e também como uma base de conhecimento dinâmica ao profissional.
- Eficiência administrativa: Chatbots e sistemas de triagem estão reduzindo o tempo de espera e otimizando o atendimento ao paciente, melhorando a experiência geral.
Empresas que exploram soluções de IA para a saúde devem priorizar projetos que melhorem a acessibilidade e os resultados clínicos, especialmente em mercados emergentes.
Finanças: risco, fraude e personalização
No setor financeiro, a IA provou ser essencial para a gestão de risco e a detecção de fraudes. Com volumes massivos de transações realizadas diariamente, algoritmos de IA podem identificar padrões anômalos em segundos, protegendo tanto instituições quanto consumidores.
Além disso, a IA está transformando a personalização no setor bancário. Plataformas inteligentes recomendam produtos financeiros baseados no comportamento do usuário, oferecendo experiências sob medida.
Por exemplo, o Bank of America implantou o assistente de IA “Erica”, para auxiliar clientes em diversas operações bancárias, como transferências de dinheiro, pagamentos de contas e monitoramento de investimentos. Em abril de 2024, “Erica” alcançou mais de 2 bilhões de interações com mais de 42 milhões de clientes desde seu lançamento.
Agricultura: automação e sustentabilidade
O uso de IA no agronegócio é outro campo de destaque. Sensores e drones equipados com tecnologia de aprendizado de máquina estão monitorando culturas e otimizando o uso de recursos como água e fertilizantes. Essa abordagem não só aumenta a eficiência, mas também promove a sustentabilidade ambiental.
De acordo com o Polo Sebrae Agro, a aplicação de inteligência artificial na agricultura tem demonstrado potencial significativo para aumentar a produtividade e otimizar o uso de recursos. Por exemplo, o uso de IA pode reduzir os custos em 10% a 40% e aumentar a produtividade diária dos funcionários em 20% a 30%. Além disso, segundo o Exame, a adoção de tecnologias de agricultura de precisão tem contribuído para o aumento da produção agrícola no Brasil, que registrou um crescimento de 15% em 2023. Projetos que combinam IA com práticas de ESG (ambiental, social e governança) têm atraído a atenção de investidores globais.
Manufatura: IA para operações industriais
A manufatura avançada tem se beneficiado de tecnologias como manutenção preditiva, onde sensores monitoram equipamentos e preveem falhas antes que ocorram. Isso reduz o tempo de inatividade, economizando milhões de dólares para grandes indústrias. A McKinsey relatou que a manutenção preditiva pode reduzir o tempo de inatividade das máquinas em 30% a 50% e aumentar a vida útil dos equipamentos em 20% a 40%. Esse dado evidencia que a adoção de manutenção preditiva baseada em IA pode resultar em reduções significativas nos custos operacionais e prolongar a vida útil dos equipamentos.
Evite o hype: quais projetos de IA não são viáveis?
Nem todos os projetos de IA são promissores. Muitos fracassam devido a expectativas infladas ou objetivos mal definidos. O uso de IA sem um propósito claro pode gerar projetos de alto custo, sem a real aplicabilidade. Aqui estão alguns exemplos de onde a IA pode ser inviável:
Ferramentas sem um caso de uso claro: Desenvolver uma solução de IA sem entender o problema real que ela resolve é uma receita para o fracasso.
Falta de dados de qualidade: A IA depende de dados precisos e em grande volume. Sem isso, os resultados serão imprecisos e ineficazes.
Automação sem supervisão: A automação completa, sem envolvimento humano, ainda está longe de ser uma realidade confiável, especialmente em setores críticos.
Esses exemplos destacam a importância de um planejamento estratégico sólido antes de investir em projetos de IA.
O papel dos líderes: como escolher os projetos certos
Para garantir que sua organização extraia o máximo valor de seus investimentos em inteligência artificial, é essencial adotar práticas estratégicas que orientem o processo. O primeiro passo é estabelecer objetivos claros. Antes de incorporar qualquer tecnologia, é fundamental identificar as metas específicas que se deseja alcançar, garantindo que cada iniciativa tenha um propósito definido e alinhado aos resultados esperados.
Além disso, é importante priorizar o impacto no negócio. Avaliar como a solução de IA contribuirá diretamente para áreas como o aumento da receita, a redução de custos ou a melhoria na experiência do cliente ajuda a direcionar os esforços para iniciativas que realmente fazem a diferença. Essa análise estratégica evita desperdícios e maximiza os benefícios obtidos com a implementação da tecnologia.
Outra etapa crucial é testar as soluções em pequena escala antes de expandi-las para toda a organização. A prototipagem permite identificar possíveis falhas, ajustar processos e reduzir riscos, garantindo que a adoção da tecnologia seja segura e eficiente. Esse cuidado inicial pode ser determinante para o sucesso de uma implementação em larga escala.
Por fim, é indispensável capacitar a equipe. Muitas vezes, projetos envolvendo inteligência artificial falham porque as equipes não estão preparadas para lidar com as ferramentas e mudanças que elas trazem. Investir em treinamento contínuo é a chave para desenvolver habilidades e criar um ambiente onde a tecnologia possa ser plenamente aproveitada, promovendo inovação e resultados consistentes.
Empresas que lideram com uma mentalidade orientada por dados e resultados terão mais chances de sucesso.
O frenesi inicial em torno da IA gerou uma onda de entusiasmo que, em muitos casos, resultou em expectativas irreais. No entanto, à medida que o mercado amadurece, os projetos viáveis começam a emergir como aqueles que resolvem problemas concretos e têm impacto real nos negócios.
Portanto, setores como saúde, finanças, agricultura e manufatura estão liderando o caminho com soluções práticas que geram valor. Por outro lado, empresas que buscam adotar IA sem uma estratégia clara correm o risco de desperdiçar recursos, não apenas financeiros, mas preterindo projetos que realmente poderiam gerar valor.
Agora, mais do que nunca, cabe aos líderes de tecnologia e empresários separar o hype da realidade e investir em projetos que realmente importam. A IA tem o potencial de transformar indústrias, mas o sucesso depende de uma abordagem cuidadosa e estratégica.