A transformação digital acelerada pelos últimos anos escancarou uma realidade que já vinha sendo discutida nos bastidores do mercado: a escassez de profissionais qualificados em tecnologia e cibersegurança. O problema não é apenas a alta demanda, mas o descompasso entre o perfil que as empresas procuram e o que os jovens enxergam como uma carreira atrativa.
O “Cybersecurity Workforce Study 2024” da ISC2 revelou que a lacuna global de profissionais em cibersegurança aumentou para aproximadamente 4,8 milhões de vagas não preenchidas, representando um aumento de 19% em relação ao ano anterior. Só no Brasil, estima-se que o setor tenha mais de 100 mil posições abertas com dificuldade de contratação. E o cenário não é diferente para outras áreas de TI, como engenharia de software, ciência de dados e infraestrutura em nuvem.
Diante disso, surge a pergunta: como atrair a nova geração para construir carreira em tecnologia e segurança digital? A resposta exige mais do que anúncios de vagas. É preciso ajustar a mensagem, os canais, os valores e a forma como o setor se apresenta.
A nova geração quer propósito, não apenas emprego
As gerações mais jovens — especialmente a Geração Z (nascidos a partir de 1997) — têm uma relação diferente com o trabalho. Segundo pesquisa da Deloitte Global 2023 Gen Z and Millennial Survey, os principais fatores que influenciam a escolha de carreira dessa geração incluem:
- Propósito e impacto social
- Qualidade de vida e saúde mental
- Crescimento pessoal e aprendizado contínuo
- Diversidade, inclusão e responsabilidade ambiental
Ou seja, salários e benefícios continuam relevantes, mas não são mais o único fator de decisão. Isso exige das empresas uma mudança na forma como apresentam as oportunidades em TI e Cyber: a carreira precisa ser mostrada como relevante para a sociedade, desafiadora intelectualmente e alinhada com valores pessoais.
“A segurança digital é a nova linha de frente da proteção da sociedade. Proteger dados é proteger pessoas.” — Brad Smith, presidente da Microsoft
Ao traduzir isso em mensagens claras, o setor pode reposicionar a imagem da cibersegurança como algo moderno, necessário e alinhado com as aspirações da nova geração.
O erro comum: linguagem técnica e distante
Um dos principais problemas está na forma como a indústria se comunica. Termos excessivamente técnicos, descrição de cargos frios e jargões incompreensíveis afastam candidatos em potencial. Para muitos jovens, TI e Cyber ainda soam como áreas “difíceis, masculinas, fechadas e excludentes”.
A mensagem precisa ser mais próxima, inspiradora e clara sobre o propósito da carreira. Por exemplo: Em vez de: “Buscamos analista SOC nível 2 com experiência em SIEM e resposta a incidentes”. Tente: “Você gosta de resolver problemas e proteger pessoas contra ameaças digitais? Que tal começar sua carreira em um time que está na linha de frente da segurança digital?”
De acordo com a Vorecol HRMS, a geração Z valoriza aspectos como flexibilidade no ambiente de trabalho, oportunidades de crescimento e desenvolvimento profissional, bem como um propósito claro e alinhado com os valores da empresa..
Quais mensagens realmente funcionam?
Com base em pesquisas de employer branding, marketing educacional e neurociência do comportamento jovem, aqui estão algumas mensagens que tendem a gerar maior conexão com a nova geração:
- “Faça parte da geração que vai proteger o futuro digital do planeta.”
- “Seja pago para aprender, crescer e fazer diferença no mundo real.”
- “Você não precisa saber tudo. A gente te ensina. Só precisa ter vontade de aprender.”
- “TI e cibersegurança não são só para experts em código. Precisamos de gente criativa, curiosa e com visão.”
- “Somos diversos, inclusivos e estamos quebrando os velhos estereótipos do mundo tech.”
Essas mensagens conectam valores emocionais com uma proposta concreta de carreira — algo que gera muito mais engajamento do que a tradicional lista de requisitos. Os líderes precisam saber a hora de ser mentor e a hora de ser coach, o mentor dá o direcionamento e ensina com sua experiência e o coach, estimula, empodera sem dar respostas.
A importância de mostrar trajetórias reais
A nova geração quer se ver nos lugares onde pretende estar. Mostrar profissionais reais — de diferentes perfis, idades, gêneros, raças e formações — é fundamental para quebrar barreiras invisíveis.
Campanhas como a “Cybersecurity is for everyone”, promovida pela Cybersecurity & Infrastructure Security Agency (CISA) nos EUA, mostraram que histórias reais humanizam o setor, aumentam a diversidade de candidatos e aproximam o público jovem das possibilidades da área.
Iniciativas semelhantes no Brasil, como a trilha educacional gratuita “Jornada da Cibersegurança” da Microsoft em parceria com o Senai-SP, também têm buscado democratizar o acesso à formação e mostrar caminhos de entrada acessíveis, inclusive para quem vem de contextos sociais mais diversos.
Não basta comunicar bem. É preciso criar oportunidades reais
Atrair jovens exige mais do que uma boa narrativa. É necessário baixar as barreiras de entrada e oferecer rotas reais de capacitação e evolução profissional. Algumas estratégias eficazes incluem:
- Programas de estágio estruturados com mentoria
- Trilhas de formação técnica acelerada, em parceria com edtechs
- Bolsas de estudo para grupos sub-representados na tecnologia
- Laboratórios práticos e simulações reais de ameaças
- Hackathons e desafios gamificados para quem está começando
Também há os profissionais que descobriram o setor tardiamente e que, se tivessem conhecido as possibilidades antes, teriam começado a carreira mais cedo. Ou seja, existe um “gap de descoberta” que precisa ser resolvido com ações de comunicação, educação e incentivo direto à entrada no setor.
Onde comunicar? Os canais certos para falar com a nova geração
Para alcançar essa audiência, os canais tradicionais de RH já não são suficientes. As empresas que querem atrair jovens para TI e Cyber precisam estar onde eles estão:
- TikTok, Instagram e YouTube com conteúdo leve e visual
- Twitch e Discord para ações de engajamento com comunidades gamers
- LinkedIn com conteúdo voltado a “first jobbers” e trilhas de carreira
- Plataformas de aprendizado como Alura, DIO, Rocketseat e Coursera, com presença ativa e patrocínio de desafios
Além disso, parcerias com escolas técnicas, universidades e ONGs de formação digital têm sido eficazes para gerar pipeline de talentos mais alinhado com os valores que o setor precisa hoje.