Do Zero ao Jurídico 4.0, uma jornada

‎Por Anahí Llop

Quando fui convidada a colaborar com esta edição, pensei muito no conteúdo que poderia apoiar profissionais que pretendem tornar suas áreas verdadeiros parceiros de negócios, com indicadores (KPIs) significantes para organização, que transmitam em números o trabalho, na maioria das vezes silencioso, da área jurídica.

Nenhuma regra é absoluta, mas um bom trabalho jurídico, muitas vezes é discreto, sem deixar de ser caloroso e enérgico. E neste ponto, alguns profissionais enfrentam dificuldade em mostrar a relevância de seu trabalho, exatamente por ter sido tão bem executado, afastando a materialização de riscos e abstraindo a necessidade do advogado super-herói.

A empresa flui com serenidade, sem clareza que essa trajetória, somente é possível pela presença de profissionais jurídicos, pavimentando a via de antemão, tornando o caminho linear e permitindo que seus executivos foquem naquilo que realmente importa: melhorar o produto/serviço, receita, ampliar mercado, atender a expectativa do seu cliente final.

É papel do profissional jurídico informar seus executivos que seu trabalho silente é um dos fatores que permitem essa trajetória tranquila, sem deixar de ter audácia e ser arrojada na persecução de metas.

Um primeiro ponto a se ter em mente é que todo trabalho pode ser mensurado, ora, os profissionais de direito em escritórios são experts neste tópico: pareceres, memos, horas trabalhadas têm seu valor quantificado através da medida preço.

A base do trabalho é a mensuração de entregas, informações e relevantes para o negócio e direcionamento.

1.  Mensuração

2.  Fomentar – empresa com dados relevantes

3.  Apontar/Guiar

1.  Mensuração de trabalhos:

Todo trabalho é passível de quantificação e, essa quantificação irá permitir a formação de KPIs da área. Em alguns seguimentos do direito, a quantificação é mais fácil:

A. Contencioso:

Métricas como:
– Número de ações recebidas/propostas em determinado período (mês, trimestre, semestre)

– Números de ações enceradas (no mesmo período que o escolhido acima)

– Porcentagem entre ações recebidas/propostas e encerradas – % de encerramento, irá sinalizar se a carteira ativa está crescendo ou diminuindo.

– Provisionamento do período com a variação do período anterior,

– Risco evitado nas ações ou Valores recuperados no período.

E assim, sucessivamente, extraindo números que indiquem o desempenho da carteira processual.

Este controle pode partir de um simples excell e ser alimentado com um powerBI ou outras ferramentas de análise. Ele bem alimentado, poderá informar as causas raízes das ações e permitir inferências úteis às unidades de negócios.

Com o tempo, ou a depender do volume de processos um sistema de ERP jurídico poderá ser necessário, mas veja, tudo se iniciou com um simples excell.

B. Consultas:

A mesma sistemática será utilizada para aquelas consultas que chegam no café, nos aplicativos de mensagens (slack, discord, whatsapp e o já quase ultrapassado e-mail). Cada pergunta, fato novo pode ser alimentado em um excell, com dados básicos como: área demandante, empresa, projeto, assunto, tempo de resposta.

Este compilado de informações, também, trará números significativos, qual o cliente interno mais demandante, se as consultas versam sobre um mesmo tema: um treinamento poderia empoderar a área cliente a ter mais informações e autonomia sobre o tema. Um manual poderia ser redigido (preferencialmente em linguagem simples e com visual law), distribuindo conhecimento.

Tudo isso em um excell que poderá ser substituído por um bot de atendimento na rede interna de mensageria, por um sistema de dashboard específico para consultas ou mesmo em um jira.

Veja que novamente a pedra fundamental é a organização das informações, em alguma plataforma: excell, googleshits, softwares etc. Para se extrair informações que tragam inteligência ao negócio e principalmente, demonstrem o quanto a área é importante para guiar os negócios em suas novas estratégias.

Note que a extração de métricas é possível em todas as vertentes do direito e da vida, seja em contatos, relações governamentais, gerenciamento de projetos. A primeira pergunta é: qual dado deste trabalho eu consigo mensurar e a partir dele, ir avançando para outros que no final, trarão números significativos para você avaliar o que faz ou não sentido ao seu negócio.

Exemplos de outros indicadores: entrada de contratos, contratos assinados, contratos segmentados por valor, segmentados por template padrão ou da empresa, SLA… . Projetos de Lei propostos, em tramitação, que merecem acompanhamento próximo, engajados em associações…. Números de reuniões, respostas em emails e slacks, participação em grupos de trabalho (canais em mensagerias, cerimonias de trabalho…), e assim por diante.

A partir de números iniciais, minimamente estruturados, é possível passar à fomentar a empresa com dados relevantes.

 Uso de dados – relevância para o negócio.

Com números iniciais é possível despertar a curiosidade e buscar a razão de alguns fatos. Qual é o problema que eu tenho que origina o contencioso? Consigo diminuir a raiz do problema com guias explicativos aos clientes ou aos colaboradores? Aumentando a área de educação, prevenção de segurança, consigo minimizar a ocorrência do fato gerador ou melhorar meus índices de vitória?

Qual é o maior volume de trabalho na área contratual? É possível automatizar? Como tornar mais célere a área? Quais os valores de contratos que a área analisa?  Quais deles tem relevância para a empresa?

Ou seja, é possível criar um bolsão de informações e a partir dele extrair informações que passam a primeiro orientar o próprio trabalho jurídico, localizando oportunidades de melhora, implementação de eficiência operacional, análise de capacidade do profissional versus atividade realizada.

Em um segundo, auxiliam o jurídico a se conectar com seu cliente interno e com o negócio, ora, percebi que a maior demanda contratual é da área de marketing, essa informação é a janela de oportunidade para chamar o líder da área, escutar (com o coração aberto) o que não funciona, fazer uma escuta passiva, sem defesa, refletir sobre e implementar melhorias.

Vale ressaltar que muitas vezes, não importa apenas fazer um bom trabalho, mas a percepção pelo outro que o trabalho é bem-feito e entregue é importante.

Aqui cabe um exemplo de situação pela qual passei: o líder de uma área interna da empresa, tinha a ‘percepção’ de que o jurídico não entregava respostas aos seus questionamentos. O fato era que o jurídico entregava os conteúdos de formal verbal e formalizava em atas de reuniões recorrentes com o líder em questão e seu time. Ora, na percepção dele, não havia entrega. O time passou a formalizar as orientações por email, finalmente o trabalho passou a ser percebido, muito embora fosse uma mera repetição da orientação dada em reunião.

A percepção do cliente importa muito mais que os fatos. Podemos ser o melhor jurídico, mas só temos valor se o cliente percebe nossas entregas.

São vários exemplos como este que auxiliam o negócio com fomento de informações que geram reflexão e passarão a orientar o negócio.

2.  O jurídico Guia

Como vimos, a implementação da dados é fundamental, para o início de reflexões da área e do próprio negócio.

Se a empresa irá focar em determinado produto e este é o responsável por demandas judiciais, vale colocar no plano de expansão: criar um plano de acordo já no primeiro atendimento? Aumentar o orçamento do jurídico para patrocínio de ações? Aderir a um programa de solução de disputas?

Se o crescimento estiver focado em contratos com grandes clientes, a área está munida de advogados com capacidade de criar conexões e negociar os contratos sem gerar entraves desnecessários? E se for em contratos de ticket baixo e alto volume, como a área está preparada para auxiliar a empresa? Há automações ou contratos de adesão?

A empresa passará por um processo regulatório? A área está preparada para auxiliar na discussão dessas regulamentações e futura adequação dos negócios?

A existência de dados estruturados, auxiliam no entendimento da dinâmica passada de mercado, momento presente e dão alguma previsibilidade de futuro. Além de empoderar dilemas como construção de orçamento, manutenção de headcount.

Como vemos, o advogado de hoje, evoluiu muito. Não basta conhecer o direito, mas entender suas consequências financeiras no âmbito empresarial e passar a fomentar os executivos de dados fáticos que os auxiliem na busca da perpetuidade de seus negócios.

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CONSELHEIR@

Anahí Llop

Mais de 20 anos de experiência no mercado de Internet, atualmente ocupo a posição de Diretora Jurídica no Grupo OLX e integro o Comitê de Ética da empresa. Responsável pela coordenação jurídica das operações comerciais da OLX. Conselheira da Câmara Brasileira da Economia Digital – Câmara e-net, integrante da Comissão de Apoio a Departamentos Jurídicos OAB SP. Graduada e Pós Graduada em Direito Empresarial pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e LLM (Master of Law) em Direito Empresarial – Centro de Extensão Universitária – CEU LAW SCHOOL.

Na atual posição fui responsável por várias fases da estruturação da OLX desde 2011, readequando a estrutura societária da empresa, revisão tributária da atividade da empresa. Suporte jurídico para as alterações necessárias à profissionalização da empresa (de 7 funcionários para atuais 1800), abertura de novas filiais.

Atuação na gestão de crises e Relações Governamentais com atuação determinante no Marco Civil da Internet. Participação na formação da Joint Venture entre as empresas Bom Negócio (Schbisted) e OLX (Naspers) e unificação das atividades.

Há 14 anos liderando o time jurídico da OLX Brasil, com a missão de manter e auxiliar o crescimento seguro da plataforma.

Especialidades: Direito do Consumidor, Direito Digital, Relações Governamentais, Direito Corporativo, Contratos, Contencioso, Negociações Complexas.

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