Introdução
A proteção de dados pessoais deixou de ser apenas uma preocupação técnica e passou a ocupar posição estratégica nas organizações. Desde a entrada em vigor da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), empresas passaram a ter a responsabilidade legal de garantir a segurança das informações e a privacidade dos seus clientes. Isso envolve não apenas aspectos jurídicos, mas também decisões operacionais, tecnológicas e de governança.
Para apoiar essa jornada, frameworks de segurança da informação se tornaram ferramentas fundamentais. Dentre eles, destaco o CIS Controls, desenvolvido pelo Center for Internet Security (CIS). Tal framework possui abordagem prática, priorizada e adaptável. Composto por 18 controles, o modelo oferece diretrizes claras sobre como proteger ativos, dados e usuários, ajudando as organizações a fortalecerem sua postura de segurança e atender, com mais confiança, às exigências da LGPD.
Como o CIS Controls se Alinha à LGPD
A LGPD não impõe ferramentas específicas, mas exige que o controlador e o operador adotem medidas eficazes para proteger os dados que realizam o tratamento. Para tanto, a Lei estabelece princípios e obrigações que precisam ser traduzidos em ações concretas. Nesse sentido, o CIS Controls atua como um guia prático que ajuda as organizações a incorporarem esses princípios de forma estruturada, especialmente os previstos:
- no Art. 6 (Princípios da Lei),
- na Seção I (Art. 46 a 49 – Da Segurança e das Boas Práticas),
- e na Seção II (Art. 50 a 52 – Da Governança).
1. Princípios da LGPD (Art. 6) e os Controles CIS
A LGPD se estabelece diversos princípios que são a base para a aplicabilidade das demais diretrizes estabelecidas pelo legislador, destaco aqui os princípios da necessidade, prevenção, segurança e responsabilização. O CIS Controls oferece ferramentas técnicas que dão suporte direto à aplicação desses princípios no dia a dia das operações da seguinte forma:
- Segurança e Prevenção:
A partir da implementação dos controles de segurança previstos no CIS Controls, a organização consegue demonstrar que adotou medidas de proteção contra acessos indevidos, vazamentos ou perdas de dados. De maneira geral, todos os 18 controles apoiam no cumprimento desse princípio.
- Necessidade e Finalidade:
O controle de acessos (domínio 6) e o inventário de ativos e softwares (domínios 1 e 2) ajudam a garantir que apenas os dados estritamente necessários sejam acessados por pessoas autorizadas, sempre dentro do propósito estabelecido.
- Responsabilização e Prestação de Contas:
Controles como registro de logs de auditoria (domínio 8) e desenvolvimento seguro de sistema (domínio 16) apoiam a produção de evidências que comprovam a adoção de boas práticas, reforçando a transparência e a responsabilidade das organizações.
O CIS também disponibiliza gratuitamente uma planilha de autoavaliação dos controles. Esse recurso permite que o agente de tratamento avalie de forma estruturada o grau de implementação de cada controle com base nos Implementation Groups (IG1, IG2 e IG3). A ferramenta ajuda a identificar lacunas, justificar ações corretivas e priorizar investimentos com base no risco. Além disso, serve como base objetiva para definir o nível de maturidade do programa de governança em segurança da informação, contribuindo diretamente para a prestação de contas exigida pela LGPD e o planejamento de evolução contínua da organização.
2. Segurança no Tratamento dos Dados (Art. 46 a 49)
A Seção I, do Capítulo VII da LGPD trata diretamente da obrigação de proteger os dados pessoais, com base em medidas técnicas e administrativas. Nesse contexto, o CIS Controls consegue atender às obrigações previstas nesses artigos da seguinte forma:
- Art. 46 – Medidas de Segurança – alicerce técnico necessário para atender a esse artigo:
- Domínios 1 e 2 garantem visibilidade dos ativos e softwares utilizados.
- Domínio 3 estabelece proteção e governança sobre o processo de tratamento dos dados.
- Domínio 4 foca em configurações seguras para reduzir vulnerabilidades.
- Domínios 5 e 6 organizam e restringem o acesso aos dados tratados pela organização.
- Domínio 7 estabelece diretrizes para que organização consiga monitorar e tratar diferentes vulnerabilidades em seus ativos.
- Domínio 8 traz orientações sobre como a organização deve manter registros para auditoria e detecção de falhas e/ou eventos que podem ajudar a resolver e explicar um incidente.
- Domínio 17 estrutura a resposta a incidentes com clareza.
- Art. 47 – Segurança desde a Concepção
A LGPD orienta que medidas de proteção devem ser consideradas desde a criação de produtos e serviços. O domínio 16 reforça esse princípio ao estabelecer práticas seguras no desenvolvimento e manutenção de sistemas.
- Art. 48 – Comunicação de Incidentes
Um dos maiores desafios práticos da LGPD é o tratamento de incidentes. O Domínio 17 trata diretamente desse tema, propondo a criação de planos de resposta, atribuição de responsabilidades e fluxos de comunicação — aspectos fundamentais para a notificação à ANPD e aos titulares.
- Art. 49 – Proteção em Transferências Internacionais
A proteção de dados transferidos internacionalmente exige a adoção de práticas robustas. Os CIS Controls oferecem suporte por meio de:
- Domínio 3 – Proteção de Dados: criptografia e restrição de acesso, aplicáveis tanto local quanto em ambientes externos;
- Domínio 13 – Segurança de Rede: proteção do tráfego de dados que podem ser aplicados em redes públicas ou interorganizacionais;
- Domínio 15 – Gestão de Provedores de Serviço: monitoramento e avaliação de terceiros, incluindo provedores em nuvem;
- Domínio 4 – Configuração Segura: garantia de segurança técnica mesmo em ambientes terceirizados ou distribuídos.
3. Boas Práticas e Governança (Art. 50 a 52)
A segunda seção do capítulo VII da LGPD trata de práticas de governança que reforçam a cultura de proteção de dados. Assim como nos demais pontos trazidos até aqui, para tais artigos o CIS Controls também se mostra uma ferramenta eficiente para garantir um cumprimento da Lei.
- Art. 50 – Programas de Governança em Privacidade
A LGPD incentiva a adoção de políticas, treinamentos (ações educativas) e procedimentos internos. O domínio 14, dedicado à conscientização e capacitação, cumpre papel essencial nesse aspecto, promovendo a cultura de segurança em todos os níveis da organização.
- Art. 52 – Aplicação de Sanções
Em caso de infrações, a existência de uma estrutura técnica e de governança baseada nos CIS Controls pode ser considerada um atenuante, ao evidenciar o esforço da empresa em cumprir seus deveres legais.
Conclusão
A adequação à LGPD não se faz apenas com políticas ou boas intenções. É necessário estruturar processos, adotar práticas de segurança consistentes e manter evidências de conformidade. O CIS Controls surge como um guia objetivo e testado, que transforma os princípios da LGPD em ações técnicas viáveis, escaláveis e auditáveis.
Ao alinhar seus processos de segurança da informação ao CIS Controls, as organizações fortalecem sua capacidade de proteger dados pessoais, ganham maturidade operacional e constroem uma reputação baseada na responsabilidade e na confiança — pilares fundamentais da nova era digital.
Referência:
Center for Internet Security – CIS Controls v8: https://www.cisecurity.org/controls