Como superar os desafios de liderar uma equipe de Offensive Security?

‎Por Dante Souza

Liderar uma equipe de Offensive Security é, por definição, navegar por um território onde a zona de conforto não existe. Ao contrário de outras áreas da cibersegurança, onde o foco está na proteção reativa e preventiva, o trabalho de uma equipe de OffSec é, essencialmente, pensar como um atacante. E liderar profissionais cujo papel é quebrar sistemas, ainda que eticamente, exige não apenas conhecimento técnico profundo, mas também uma sensibilidade humana apurada e uma capacidade rara de equilibrar riscos, prioridades e talentos altamente especializados.

O primeiro desafio é montar um time verdadeiramente competente. Profissionais de OffSec não são abundantes no mercado, e menos ainda certificados. Muitos têm trajetórias autodidatas, perfis disruptivos e pouca aderência a modelos tradicionais de hierarquia. Não é incomum que o líder se depare com gênios técnicos que têm pouca tolerância à burocracia ou que demonstram resistência a seguir processos formais. Saber identificar, contratar e reter essas pessoas é, por si só, uma habilidade crítica.

A Segunda barreira vem na forma de confiança organizacional. Muitas empresas ainda hesitam em adotar práticas de Red Teaming e testes de intrusão, expressando preocupações quanto às simulações de ataque. Nem sempre a alta gestão compreende que permitir tais simulações em seus sistemas é uma medida para fortalecer a segurança do negócio. Nesse contexto, a liderança de uma equipe de Offensive Security deve desempenhar um papel educativo, traduzindo termos técnicos em impactos financeiros e atuando como elo entre a equipe técnica e as demais áreas da organização.

Outro ponto de tensão frequente é o equilíbrio entre ética e agressividade técnica. Ao simular ataques, a equipe precisa avançar o mais próximo possível de um agente real de ameaça, mas sem causar danos colaterais ou violar normas internas. Essa linha tênue exige não apenas habilidade técnica, mas um código de conduta claro, pactuado com a liderança. O papel do líder aqui é garantir esse alinhamento ético sem tolher a criatividade do time.

Gerenciar o estresse é também uma habilidade essencial. Os profissionais de OffSec lidam com missões de alta pressão, prazos apertados e, muitas vezes, a responsabilidade de identificar falhas críticas antes que um atacante real o faça. Além disso, são constantemente desafiados a inovar, já que o adversário muda de tática a cada dia. O líder precisa cultivar um ambiente que promova saúde mental, sem diminuir o senso de urgência e missão.

A contínua atualização configura-se como outro requisito essencial. Ferramentas, técnicas, linguagens e estratégias evoluem com notável rapidez, tornando obsoleto em curto prazo aquilo que anteriormente se apresentava como inovador. Destarte, o líder de uma equipe de Offensive Security deve estimular e possibilitar o aprendizado constante, não se restringindo a capacitações formais, mas também promovendo ambientes de experimentação, facilitando o acesso a laboratórios especializados e incentivando a participação em comunidades  “hacker”

A relação com outras equipes de segurança também pode ser desafiadora. Muitas vezes, o time de OffSec é visto com desconfiança pelas áreas de Blue Team, infraestrutura ou compliance, que receiam os impactos dos testes ofensivos. Cabe à liderança criar uma cultura de colaboração, mostrando que o objetivo final é comum: fortalecer a postura de segurança da organização. Isso exige habilidade política e comunicação estratégica.

Há ainda um desafio particular relacionado à mensuração de resultados. Diferente de áreas onde KPIs podem ser facilmente atribuídos, os resultados de uma equipe de OffSec muitas vezes são qualitativos. Como traduzir para o board o valor de ter descoberto uma falha crítica antes de um ataque real acontecer? O líder precisa desenvolver métricas inteligentes, capazes de mostrar o impacto das ações ofensivas em termos de prevenção de riscos e economia potencial de recursos.

Outro ponto sensível está na governança e nos limites do escopo das ações ofensivas. Definir regras claras para os testes, manter registros, documentar decisões e seguir normas como a ISO/IEC 27001 é fundamental para evitar extrapolações ou mal-entendidos. O líder precisa manter esse controle sem transformar a operação em algo engessado e pouco eficiente. Trata-se de um exercício constante de equilíbrio entre formalismo e agilidade.

Em muitas situações, o líder também se depara com decisões de alto risco. Causar indisponibilidade raramente é uma opção ( a menos que se trate de um teste devidamente autorizado de DDOS ou DOS). Todavia, devido a vários fatores que a equipe de OffSec não tem controle, indisponibilidades podem acontecer. O líder precisa trabalhar com a equipe para mitigar esse risco o máximo possível. Outro ponto é quando vulnerabilidades críticas são encontradas, principalmente em sistemas abertos na “borda”.  Muitas dessas vulnerabilidades críticas, tem CVEs públicas com exploits e até mesmo tutoriais disponíveis na internet ensinando como explorar. Manter uma boa comunicação com os clientes e demais stakeholders envolvidos é essencial para mitigar essas vulnerabilidades assim que encontradas, impedindo que um atacante da vida real as explore. Como lidar com a descoberta de vulnerabilidades em aplicações críticas com grande exposição pública? É necessário saber escalar essas decisões para os níveis corretos, ponderando riscos técnicos, jurídicos e de imagem. A liderança precisa agir com serenidade e responsabilidade, mesmo em cenários de crise.

É importante destacar ainda o papel pedagógico da equipe de OffSec. O trabalho não termina com o relatório técnico. Parte do valor está em ajudar as áreas impactadas a entenderem as falhas, seus potenciais impactos e, principalmente, como evitá-las no futuro. O líder deve fomentar uma cultura de compartilhamento de conhecimento, onde cada teste é também uma oportunidade de aprendizado coletivo.

Um bom líder de OffSec também precisa se posicionar estrategicamente dentro da empresa. Não basta comandar ataques simulados. É necessário estar inserido nas discussões sobre novos projetos, produtos e inovações tecnológicas. Quanto mais cedo o time ofensivo for incluído nas iniciativas, maiores as chances de se evitar erros graves desde o início. Isso exige visão de negócio e participação ativa nos fóruns de decisão.

Há ainda o desafio de lidar com o ego técnico. Equipes altamente qualificadas podem sofrer com disputas internas, vaidade e competitividade excessiva. O líder precisa construir uma cultura de colaboração e respeito, onde os resultados do time são mais importantes do que conquistas individuais. Isso passa por escuta ativa, mediação de conflitos e clareza nos objetivos coletivos.

A diversidade em equipes de Segurança Ofensiva, frequentemente caracterizadas por uma predominância de perfis técnicos masculinos, representa um fator frequentemente negligenciado. A incorporação de profissionais com vivências singulares, formações multidisciplinares e conhecimentos heterogêneos tem o potencial de aprimorar a inventividade do grupo. Urge que a gestão estimule a inclusão e persiga proativamente essa pluralidade de talentos, reconhecendo-a como um ativo substancial para a avaliação de riscos.

Além disso, é comum que a equipe atue em um modelo de consultoria interna, atendendo demandas de múltiplas áreas. Isso pode gerar sobrecarga, frustração e perda de foco. O líder precisa fazer uma boa gestão de backlog, definir critérios de priorização e proteger o time de pedidos irrelevantes ou mal estruturados. A capacidade de dizer “não” com firmeza e educação é parte essencial da liderança.

Não podemos esquecer que, apesar da atuação ofensiva, a equipe de OffSec precisa estar alinhada com os valores da organização. Sua missão é proteger, não impressionar com técnicas sofisticadas. O líder deve reforçar constantemente que o objetivo não é “derrubar” sistemas ou “mostrar fraquezas”, mas fortalecer a organização por meio do enfrentamento ético e inteligente de riscos reais.

Outro aspecto importante é a relação com fornecedores e parceiros. Muitas vezes, parte dos testes é terceirizada, ou utiliza ferramentas comerciais. O líder precisa garantir que esses recursos estejam alinhados com as diretrizes internas, sejam auditáveis e não exponham a empresa a riscos desnecessários. Isso exige capacidade de negociação e critérios sólidos para avaliação de soluções.

A resposta a incidentes é outra área de interface crítica. Um bom líder de OffSec deve garantir que os aprendizados dos testes ofensivos alimentem os playbooks de resposta e os planos de contingência. Além disso, em cenários reais de ataque, a experiência da equipe pode ser fundamental para simular comportamentos do adversário e orientar contra medidas.

Em tempos de inteligência artificial, o cenário ofensivo muda rapidamente. Ferramentas de automação, scripts baseados em IA e ataques cada vez mais sofisticados obrigam os líderes a repensar suas estratégias. Incorporar Machine Learning, avaliar ameaças baseadas em LLMs e explorar defesas adaptativas são movimentos cada vez mais necessários. Liderar nesse novo contexto exige curiosidade, capacidade de experimentação e coragem para inovar.

Por fim, é preciso ter uma visão de legado. Uma boa liderança de OffSec não se resume aos testes do presente, mas constroi uma cultura organizacional resiliente, capaz de identificar, antecipar e neutralizar ameaças com autonomia. Formar novos líderes, disseminar o conhecimento e posicionar a segurança ofensiva como aliada do negócio são metas que exigem visão de longo prazo, humildade e compromisso com o todo.

Liderar uma equipe de Offensive Security é uma missão que combina arte, ciência e gestão de pessoas. É, ao mesmo tempo, desafiador e fascinante. Exige coragem para navegar por zonas cinzentas, sabedoria para lidar com talentos extraordinários e visão para transformar ataques simulados em blindagens reais. E, acima de tudo, exige líderes que saibam que, nesse jogo, o maior valor não está em invadir, mas em proteger com inteligência.

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CONSELHEIR@

Dante de Souza Silva

Há mais de 20 anos trilhando o caminho da Tecnologia da Informação, e há 13 focado em Segurança Cibernética, descobri minha verdadeira vocação: proteger, educar e inspirar pessoas.

Lidero equipes de OffSec – Red Team, Pentest, Análise e Gestão de Vulnerabilidades,  e atuo como Coach de Alta Performance, impulsionando resultados estratégicos e desenvolvendo talentos para enfrentar o cenário cibernético em constante evolução. Minha experiência como Hacker Ético, me permite orientar profissionais da área  a atingir alta performance, combinando expertise técnica, inteligência emocional e um mindset estratégico para formar equipes de elite em cibersegurança.

Acredito que a segurança ofensiva cibernética transcende o código e os exploits; é uma questão de mentalidade, comunicação eficaz e inteligência emocional. Times excepcionais são construídos com conhecimento, colaboração e propósito.

Minha missão vai além do meu trabalho diário. Apoio profissionais da área a desbloquear seu potencial máximo, oferecendo mentoria individual e em grupo para quem busca crescimento técnico e comportamental na segurança da informação.

Apaixonado por tecnologia, negócios e pessoas. Compartilho conhecimento e perspectivas sobre cibersegurança, liderança e desenvolvimento humano. 

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