Os fundamentos não mudam, lide com isso

‎Por Kewin Moya

“Todo local de trabalho é um ambiente político” é o que estampa o primeiro parágrafo do livro Como Lidar Com A Política No Trabalho (Editora Sextante, 176 páginas) da Karen Dillon, editora da Harvard Business Review e co-autora de três livros com Clayton Christensen.

Acredito que, desde cedo, já tinha entranhado uma veia política em minha vida e um grande interesse pelo tema. E, sim, essa política mesmo que você está pensando.

Votações na Câmara dos Deputados e Senado, entender como funciona a máquina pública, como acontece as decisões estratégicas entre Deputados e Senadores, quais eram os limites de atuação do Executivo, Legislativo e Judiciário, como que uma ideia se transformava em lei ou como deveria ser a participação da sociedade nesse tema e assim por diante. 

Não é à toa que uma das minhas séries preferidas é House of Cards e tantas outras que possuem temáticas próximas ao tema.

Mesmo não direcionando minha carreira para esse lado, sabia que entender a política era importante, especialmente no ambiente corporativo, onde há decisões sendo tomadas a todo momento e muita negociação e interesses por trás de cada palavra escrita em um e-mail.

Durante minha caminhada corporativa, fui agraciado de ter tido uma passagem pelo maior banco da América Latina e ter desenvolvido minha carreira por ali, foi extremamente importante, em especial, em ampliar o lado político e relacional que faz total diferença na geração de resultados.

Me lembro que quando li pela primeira vez a obra que abriu este capítulo, e, pude ali, naquele momento, responder muitas dúvidas que ficava pensando por dias. Eram das mais diversas situações que o ambiente corporativo pode nos proporcionar e sabia que, seja o CNPJ que for, os desafios são muito parecidos em todos eles, afinal, o principal pilar nos negócios continuam sendo as pessoas.

Entenda menos de ferramentas e mais de pessoas

“Qual é a ferramenta que vocês preferem para construir o Roadmap?”

Esse é um dos tipos de perguntas que semanalmente vejo em alguns grupos de WhatsApp em comunidades de produto que participo. Você pode trocar o ‘Product Roadmap’ por qualquer variação que dependa de alguma ferramenta.

As ferramentas são importantes para realizar um bom trabalho. Algumas trazem maior produtividade, reduzindo o tempo em tarefas que podem ser excelentes aliadas do nosso dia a dia.

Mas esse tipo de dúvida deveria ser uma das últimas preocupações profissionais. Ninguém liga muito para qual ferramenta você domina, se isso não resultar em benefícios para a empresa em forma de resultados.

Ao invés de gastar energia em temas ou discussões inúteis, que não levam a lugar algum, é importante investir no que realmente importa para um bom profissional: entender de pessoas.

O maior desafio ao longo da carreira será na construção de boas relações e entender isso o quanto antes, te poupa de algumas frustrações, principalmente quando se pensa que o reconhecimento vem através da dominância técnica.

Entenda que saber a parte técnica da coisa a se fazer é o mínimo que se espera de qualquer profissional. O desafio bruto da realidade é entender que pessoas são complexas, possuem instintos, necessidades de competição, de vencer e ego alto — me incluo nisso.

Saber fazer a leitura dos cenários, entendendo como as pessoas funcionam, pode trazer melhores benefícios no longo prazo, principalmente quando se constrói relações de valor.

Outro dia me deparei com a pergunta: “Vocês tem algum case de sucesso para compartilhar no offsite, visando integração entre o time/squad?”.

Respondi que nada une mais o time do que o pós-offsite, num happy hour com comida à vontade e liberdade para troca. Acredito que toda forma de integrar times são importantíssimas, mas muita coisa encoberta nos corredores corporativos — ou salas do Zoom, conversas no Slack ou grupos de WhatsApp —, são descobertas na mesa de um jantar, onde as pessoas estão criando as verdadeiras conexões.

Saiba fazer a leitura certa de onde você está, quem são as pessoas tomadoras de decisões, como elas atuam. Quando realizamos a nossa lição de casa de saber construir essas conexões, as coisas se tornam menos doloridas de serem conquistadas.

Os fundamentos não mudam, lide com isso

Uma das literaturas que mais gostei foi Same as Ever: A guide to what never changes (Portfolio Penguin, 240 páginas), onde Morgan Housel aborda 23 histórias que nunca mudam ao longo do tempo. Gosto de chamar isso de ‘fundamentos’.

Em uma das histórias, o autor menciona que em 2009, o famoso investidor Warren Buffett conversava com Jim e perguntou qual era a barrinha de chocolate mais vendida em 1962. Jim não sabia que era o Snickers. Bom, 47 anos depois, o Snickers continuava sendo a barrinha mais vendida.

Para refrescar sua memória, no segundo semestre de 2008, o banco americano Lehman Brothers, com seus 158 anos de vida, quebrou com a famosa crise das hipotecas. Jim, na conversa com Buffett, questionava para onde a economia iria após esse episódio difícil na economia americana — e mundial.

Tudo é um ciclo, seja a liderança das vendas das barrinhas Snickers ou grandes ciclos econômicos como foi o caso dos bancos americanos.

Entender das coisas que não mudam, facilitam demais nossa carreira, sejam nas tomadas de decisões ou simplesmente, ‘dançar o baile conforme a música’.

Jared Spool — considerado um ‘guru’ de UX —, definiu muito bem as cinco coisas que os executivos se importam:

  • Aumento de receita
  • Redução de custos
  • Aumento de novos negócios e tamanho de mercado
  • Aumento de receita dos clientes atuais
  • Aumento de valor para stakeholders

Essa citação pode ser encontrada no livro Outcomes Over Output (Sense & Respond Press, 88 páginas), de Joshua Seiden.

Afinal, por que é importante entender isso?

Porque é em relação a isso que somos cobrados em nossos trabalhos. Não é a jornada ideal do usuário, não é o melhor método utilizado, não é a melhor ferramenta de produtividade. Nada disso importa se não for relacionado com um dos cinco pilares que qualquer empresa ou liderança séria se preocupa.

Quanto antes entendermos isso, melhor será o direcionamento das nossas carreiras, das nossas decisões e dos produtos que gerenciamos.

Veja, nem todo mundo é executivo ou quer se tornar um, respondendo pela empresa ou de fato, direcionamento ações estratégicas que farão a companhia ir do lugar A para o B, mas, a ação de todos é responsável por fazer isso acontecer. Nenhuma empresa ficará no mesmo lugar com a força do trabalhador indo na direção correta. E o mais importante disso tudo, é se atentar aos fundamentos dos negócios, pois eles não mudam — seja na época da revolução industrial, seja hoje na era da IA.

Ram Charan, em sua obra O que o CEO quer que você saiba (Editora Sextante, 160 páginas), diz que “a linguagem dos negócios é a mesma” e que “ganhar dinheiro nos negócios envolve quatro pilares”

  • Satisfazer as necessidades dos clientes com mais eficácia do que a concorrência;
  • Gerar caixa;
  • Produzir retorno sobre o capital investido;
  • Manter uma rentabilidade crescente.

Entender isso nos coloca para jogar uma liga superior. Passamos das discussões inúteis como ‘o sexo dos anjos’ e começamos a olhar para o que de fato faz sentido e muda o ponteiro do nosso negócio.

O investimento oculto no Gerenciamento de Produtos

Entender de pessoas e dos negócios separa o joio do trigo e coloca Product Managers em outro patamar de atuação.

Uma parte importante da atuação está justamente na construção de pontes, seja com o mercado ou com os times internos e aqui é onde mora um desafio enorme e pouco explorado.

As organizações são regidas por interesses, dos mais diversos possíveis. Nem sempre fazemos o que queremos, mas sempre fazemos o que precisamos.

E para que o papel dos profissionais de produto ganhe ainda mais notoriedade, é através da geração de resultados e de impacto financeiro. Sem isso, existe pouco espaço de manobra e tentativa de construir confiança.

Analisar dados, identificar um problema, desenhar uma solução, desenvolver e colocar no ar é fácil, convenhamos. Mas existe um investimento oculto e difícil de metrificar e está relacionado em como as pontes com outros times e lideranças foram construídos.

Nem sempre temos todos os caminhos e ações em nossas mãos e a dependência com 5, 6, 9, 14 pessoas se torna algo comum na grande maioria das empresas. E agora, como conseguir ‘convencer’ várias pessoas, com interesses e necessidades diferentes, a realizar o que você precisa, para que o produto que você gerencia, seja construído?

Aqui é onde mora uma das principais estratégias dos Product Managers, que está na construção de relacionamentos estratégicos de longo prazo.

Entre um aperto de mão ou outro, é muito necessário construir um meio de campo com muitas pessoas, manter uma boa relação, ajudar sempre que possível, para garantir um espaço maior com essas pessoas e usar essas cartas no momento certo.

Quem nunca passou pela experiência de precisar alinhar necessidades com profissionais que não entendem da velocidade que você precisa e que qualquer atraso pode ser fatal para o momento?

Ser esse profissional que constrói pontes, que influência as pessoas a realizaram o que você precisa é fundamental e parte importante na construção e gerenciamento de produtos que possuem impacto dentro e fora das organizações.

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CONSELHEIR@

Kewin Moya

Kewin Moya, Product Specialist no Grupo Boticário, atuando há mais de 14 anos no mercado, com passagens por Itaú Unibanco, Revista EXAME e Grupo OLX. Apaixonado por café, bons livros, culinária e em jogar tênis.

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