O mercado de meios de pagamento passou por uma evolução muito grande nas últimas décadas, principalmente após o marco regulatório de pagamentos, sancionado pela Lei 12.865, que quebrou o duopólio da VisaNet e Credicard. Desde então, vimos o surgimento de várias empresas incumbentes que transformaram o mercado, trazendo mais tecnologia, competição e redução de preços, às quais quem se beneficiou no final, foram os clientes na ponta final.
Recentemente, estamos modificando a forma como realizamos pagamentos no dia a dia. Com o objetivo de melhorar a segurança e a eficiência dos sistemas de pagamento, foram desenvolvidos tokens e o protocolo 3D Secure 2.0, sendo este último uma inovação que impactou fortemente a indústria de e-commerce, pois a jornada do check in ao checkout no mundo digital se tornou muito mais fluida.
Trazendo novas experiências e modelos de negócios para indústria, como o pagamento sem contato (“contactless”) via tecnologia NFC, pagamento por QR code, links de pagamento, carteiras digitais e, mais recentemente, o PIX automático. Observamos que o mercado de pagamentos está rapidamente evoluindo do hardware para o software, e isso se acelerou com a computação em nuvem, viabilizando a transição do físico para o virtual. O cartão sem contato, que usa a tecnologia NFC, permite a troca de informações entre o cartão e o celular em um terminal de pagamento por meio de ondas de rádio de frequência 13.56 MHz.
O NFC veio para resolver os problemas tradicionais da identificação por radiofrequência RFID (“Radio frequency identification”) , garantindo que a troca de informações ocorra em uma distância máxima de até 4 centímetros. Como em toda inovação tecnológica nos meios de pagamento, surge a dúvida: para onde vai o mercado de pagamentos brasileiro nos próximos anos? Essa é uma pergunta valiosa, difícil de responder, mas algumas tendências e movimentos de mercado são observáveis. A receita do MDR, uma das principais fontes de uma credenciadora, tem diminuído significativamente nos últimos 10 anos, com uma queda média de 28% no crédito e 29% no débito, segundo o Banco Central. A registradora de recebíveis também permitiu a livre negociação dos recebíveis entre o estabelecimento e outros players, como marketplaces de recebíveis, aumentando a competição nas antecipações de recebíveis.
A redução das margens no setor, impulsionada pela tecnologia e pela concorrência crescente, além de novas regulamentações que promovem transparência e competição, levam os adquirentes a seguir dois caminhos principais, ou até combinações deles. De um lado, alguns estão se tornando bancos digitais, oferecendo não apenas soluções de pagamento, mas também produtos financeiros, investimentos e crédito, gerando alavancagem e agregando valor ao ecossistema. Outros, por outro lado, se concentram no cross-sell de produtos e soluções tecnológicas para o varejo.
Neste último cenário vemos uma modernização dos POS (Point of Sale): afinal, as máquinas se tornarão commodities? O Brasil hoje tem o segundo maior parque de máquinas em circulação no mundo, atrás apenas de Singapura, segundo a ABECS. Com a expansão das Smart-POS, máquinas que podem ter o sistema operacional android , que trabalham de forma autônoma e permitem o lojista baixar aplicativos android, assim não só usar a máquina como fim, mas agora também como meio. É interessante traçar um paralelo com o aparelho móvel, que evoluiu de um dispositivo de ligação para um aparelho multifuncional, hoje em dia o utilizamos o aparelho para tudo, e pouco para ligações de fato, fato este que está acontecendo também no mundo das maquininhas.
Outro ponto importante é o valor agregado que as credenciadoras podem gerar para o varejo como viabilizadoras. Os clientes estão cada vez mais exigentes em suas demandas, e uma empresa que atua de forma multicanal ou omnichannel enfrenta um enorme desafio. Esse desafio não se limita apenas à integração do estoque dos produtos vendidos no ambiente online e retirados no mundo físico, e vice-versa, mas também abrange a conciliação dos pagamentos, o split do pagamento e a própria liquidação. Nesse contexto, as credenciadoras podem atuar de forma disruptiva para auxiliar o varejo.
Imagine o seguinte cenário: você deseja comprar um sapato em uma loja física no shopping, mas o modelo desejado está esgotado no estoque da loja. Mesmo assim, a vendedora pode trazer um tablet, mostrar o sapato disponível na loja online, e você pode realizar a compra na loja física. Em poucos dias, o sapato é entregue na sua casa. Agora, considere que essa mesma loja opera tanto no ambiente físico quanto no e-commerce e em marketplaces. Quem ajudará esse estabelecimento comercial a integrar todas essas operações com uma solução de software? Além disso, quem fará o split do pagamento, conciliar e liquidar a transação, sem mencionar o controle do estoque?
Outra inovação é o “tap on phone”, que permite que o celular seja usado como terminal de pagamento, reduzindo os custos com hardware e proporcionando uma experiência mais conveniente para o cliente. No entanto, em transações acima de R$200, é necessária a senha do cartão. Você se sentiria confortável inserindo sua senha no celular de outra pessoa?Isso depende, talvez em situações onde haja um relacionamento de confiança, mas é uma solução que veio para ficar e deve evoluir nos próximos anos.
No campo dos bancos digitais, vemos poucos players que nasceram no setor de pagamentos e se tornaram bancos. Dados do Banco Central mostram que 84% da população brasileira é bancarizada, e 49% possui cartão de crédito. Ainda assim, há espaço para crescimento na oferta de crédito, explorando clientes já existentes nos pagamentos. O valor agregado que pode ser gerado na oferta de produtos bancários é imenso, especialmente quando se utiliza inteligência artificial e open finance para oferecer NBOs (Next Best Offer) e NBAs (Next Best Action), de forma personalizada.
Em suma, a digitalização e evolução no setor de pagamentos estão se acelerando. As inovações surgem de forma mais rápida, e quem estiver bem-posicionado, com uma mentalidade aberta para a inovação, terá a oportunidade de surfar estas novas ondas de transformação.